“Deus é Espírito, e importa que os que o adoram o adorem em espírito e em verdade” (João 4: 24).
Essa expressão de Jesus é uma síntese da lei de adoração, que consiste “Na elevação do pensamento a Deus. Deste, pela adoração, aproxima o homem sua alma” (Allan Kardec: O Livro dos Espíritos, questão 649).
Isto porque a adoração origina-se do “Sentimento inato, como o da existência de Deus. A consciência da sua fraqueza leva o homem a curvar-se diante daquele que o pode proteger” (Allan Kardec: O Livro dos Espíritos, questão 650). Além disso, “A adoração verdadeira é do coração. Em todas as vossas ações, lembrai-vos sempre de que o Senhor tem sobre vós o seu olhar” (Allan Kardec: O Livro dos Espíritos, questão 653).
Convém destacar que essa passagem se encontra no contexto do Evangelho de João, Capítulo 4, versículos de 1 a 26, quando Jesus assentou-se junto à fonte de Jacó e veio uma mulher de Samaria tirar água e mantém diálogo com o Cristo.
Cairbar Schutel assim contextualiza:
“Chegando Jesus a Sicar, cidade de Samaria, repousou perto da Fonte de Jacó, quando, à hora sexta, uma mulher veio tirar água. O Mestre pediu-lhe de beber e ela admirou-se de lhe pedir água um ‘judeu’, porque os judeus não se comunicavam com os samaritanos, por motivos religiosos.
Jesus fez-lhe ver, então, que o ‘dom’ de Deus era, mais do que judeu, mais do que samaritano, e disse a mulher: Se tu conhecesses o ‘dom’ de Deus e quem te pede água, tu lhe terias pedido ‘água’ e ele te daria, porque quem beber da ‘água’ que eu lhe der, nunca mais terá sede. A mulher julgou primeiro que Jesus lhe oferecia um meio menos trabalhoso de obter água, sem buscá-la no Poço de Jacó, mas depois de ter o Mestre afirmado que a ‘Fonte’ jorrava para a ‘Vida Eterna’, e depois de haver revelado à samaritana fatos ocorridos em sua existência, maravilhada pelos ensinos incomparáveis que recebera naquele momento, ensinos que nunca tivera ocasião de ouvir dos mestres samaritanos, deixou o cântaro e foi imediatamente para a cidade chamar o povo para que fosse ver Aquele Homem que lhe dissera tudo o que ela tinha feito e perguntava insistentemente: Não será este o Cristo?”
Em seguida, Cairbar Schutel esclarece sobre adoração a Deus:
“Este quadro, que desenha os puros sentimentos de fraternidade em sua eloquente lição, nos repete a adoração a Deus, em Espírito e Verdade. Ele ensina mais, que o ‘dom’ de Deus é a luz que nos guia para a Verdade, que essa luz não é privilégio de castas, de seitas, de famílias. Jesus, sendo judeu de nascimento e afirmando que não era verdadeira a adoração no Templo de Jerusalém, assim como não o era no Monte Garizim dos samaritanos, dá-nos uma ideia clara de que, estando Deus em toda a parte, em toda a parte devemos adorá-lo, esforçando-nos por cumprir a sua Lei.
Ensinou mais o Mestre, que a Água que sacia toda sede é a que jorra do Alto, a sua Doutrina, ministrada pelo Espírito de Deus. É assim que, num grande dia de festa em Jerusalém, Ele levantou-se e exclamou: ‘Quem tiver sede venha a mim e beba. Quem crê em mim, como disse a Escritura, do seu interior manarão rios de água viva’. (João, VII, 37-38.)”
Para ampliar essa reflexão, trazemos do Evangelho de Lucas a passagem em que o Mestre é indagado por um certo doutor da lei, tentando-o, dizendo: “Mestre, que farei para herdar a vida eterna?” (Lucas 10: 25). O Cristo responde: “Que está escrito na lei? Como lês? E, respondendo ele, disse: Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de todas as tuas forças, e de todo o teu entendimento, e ao teu próximo como a ti mesmo. E disse-lhe: Respondeste bem; faze isso, e viverás” (Lucas, 10: 26-28).
O “Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de todas as tuas forças, e de todo o teu entendimento” tem caráter direto e incisivo, refletindo o sentido verdadeiro da lei de adoração, realizada em espírito e em verdade, não mais por simples manifestações de culto externo, idólatra e ritualista, mas sim com o profundo entendimento da solicitude do Pai para com todas as criaturas.
Esse entendimento abrange o conhecimento de si mesmo e “A Causa Primária de tudo o que existe é Deus, o Criador. Conhecer-nos significa a busca de todos os potenciais de nosso ser, compreendendo o uso da razão e a conquista das virtudes, realizando o destino na luta permanente pelo autoaperfeiçoamento. Para bem dirigir esse esforço incessante de cada criatura, o Pai Celestial enviou à Humanidade seu Filho, o Mestre por excelência de cada um, o Cristo de Deus, que nos mostra como encontrar ‘o caminho, a verdade e a vida”. (Juvanir Borges Souza. Tempo de transição. FEB Editora)
Além disso, amar a Deus revela a compreensão de que o “(…) amor puro é o reflexo do Criador em todas as criaturas. Brilha em tudo e em tudo palpita na mesma vibração de sabedoria e beleza. É fundamento da vida e justiça de toda a Lei”. (Emmanuel. Pensamento e vida. FEB Editora)
Adorar a Deus em espírito e em verdade é conforme a lei de adoração, uma ação puramente espiritual, que vem da alma pela assimilação da verdade divina que liberta e na firme vontade de melhorar a união com o Pai, e mediante o desapego das coisas materiais e dos lugares específicos de adoração. A adoração a Deus não se prende a lugar, porquanto amar a Deus sobre todas as coisas é reconhecer que Ele é o Pai e Criador de todos os seres e de todas as coisas existentes no Universo.
Assim, devemos adorá-Lo em espírito e em verdade e não por manifestações de culto externo. Além disso, amar o próximo como a si mesmo define as normas de relações humanas, cujo fundamento é a lei de amor.
Com o advento do Cristianismo, Jesus revela Deus, o Criador Supremo, como Pai, amoroso e misericordioso, que não exige dos crentes manifestações externas de devoção.
Para entender a adoração, precisamos reconhecer que esta acompanha o processo evolutivo da criatura humana, uma vez que, como o homem evolui intelectual e moralmente, aperfeiçoa também sua concepção de Deus e a sua forma de adorá-lo. Devemos assimilar a mensagem cristã em toda a sua pureza.
Por fim, transcrevemos as respostas à questão 654 em “O Livro dos Espíritos”:
“Deus prefere os que o adoram do fundo do coração, com sinceridade, fazendo o bem e evitando o mal, aos que julgam honrá-lo com cerimônias que os não tornam melhores para com os seus semelhantes”.
“Todos os homens são irmãos e filhos de Deus. Ele atrai a si todos os que lhe obedecem às leis, qualquer que seja a forma sob que as exprimam”.
“É hipócrita aquele cuja piedade se cifra nos atos exteriores. Mau exemplo dá todo aquele cuja adoração é afetada e contradiz o seu procedimento”.
“Declaro-vos que somente nos lábios e não na alma tem religião aquele que professa adorar o Cristo, mas que é orgulhoso, invejoso e cioso, duro e implacável para com outrem, ou ambicioso dos bens deste mundo. Deus, que tudo vê, dirá: o que conhece a verdade é cem vezes mais culpado do mal que faz, do que o selvagem ignorante que vive no deserto. E como tal será tratado no dia da justiça. Se um cego, ao passar, vos derriba, perdoá-lo-eis; se for um homem que enxerga perfeitamente bem, queixar-vos-eis e com razão”.
“Não pergunteis, pois, se alguma forma de adoração há que mais convenha, porque equivaleria a perguntardes se mais agrada a Deus ser adorado num idioma do que noutro. Ainda uma vez vos digo: até ele não chegam os cânticos, senão quando passam pela porta do coração”.
Bibliografia:
BÍBLIA SAGRADA.
KARDEC, Allan; tradução de Guillon Ribeiro. O Livro dos Espíritos. 1ª Edição. Brasília/DF: Federação Espírita Brasileira, 2019.
MOURA, Marta Antunes de Oliveira de (organizadora). Estudo aprofundado da doutrina espírita: Ensinos e parábolas de Jesus – Parte II. Orientações espíritas e sugestões didático-pedagógicas direcionadas ao estudo do aspecto religioso do Espiritismo. 1ª Edição. Brasília/DF: Federação Espírita Brasileira, 2016.
MOURA, Marta Antunes de Oliveira de (organizadora). Estudo aprofundado da doutrina espírita: O Consolador Prometido por Jesus. 1ª Edição. Brasília/DF: Federação Espírita Brasileira, 2017.
ROCHA, Cecília (organizadora). Estudo Sistematizado da Doutrina Espírita: Programa Fundamental, Tomo I. 2ª Edição. Brasília/DF: Federação Espírita Brasileira, 2018.
SCHUTEL, Cairbar. Parábolas e Ensino de Jesus. 28ª Edição. Matão/SP: Casa Editora O Clarim, 2016.