Essa reflexão tratará do preconceito que poderá haver com certas crenças ou pessoas quanto às suas práticas do bem, da caridade e da fraternidade universal, rotulando-as como motivadas pelo mal, sendo que elas realizam ações com propósitos dignificantes perante as leis de Deus.
Para tanto, buscaremos em duas passagens evangélicas colher os ensinamentos e exemplos do Mestre Jesus para as nossas vidas em relação a essa reflexão: todo o reino dividido contra si mesmo é devastado (Mateus, 12: 22-26); e o Centurião de Cafarnaum (Mateus, 8: 5-13).
Inicialmente, abordaremos os preconceitos para, posteriormente, discorrer acerca das passagens evangélicas.
Preconceito é o ato de julgar algo ou alguém antes de conhecer o objeto de juízo, podendo se aplicar às diversas situações do cotidiano. Nesse sentido, o preconceito refere-se ao conceito antecipado à constatação dos fatos, utilizando-se de características julgadas universais, sendo atribuíveis a todos que se encaixam na categoria referida, explicita ou implicitamente, a qual é dirigida.
Pode ser, ainda, sentimento desfavorável, depreciativo, aviltante, hostil ou pejorativo, sem fundamentos lógicos, mas motivado por hábitos de julgamento ou generalizações apressadas, podendo ser de cunho étnico, racial, classe social, cor de pele, crença, sexo, diferenças culturais, estereótipos, condição econômica, dentre outros tantos.
Nesses casos, o preconceito pode tornar-se grande problema para o próprio ser humano e para a sociedade devido às possíveis consequências nocivas direcionadas a certos indivíduos ou grupos, de forma generalizada, chegando a afetar a liberdade das pessoas e a disseminar o ódio sem a preocupação com os seus efeitos.
Os sentidos de preconceitos demonstram inferioridade intelectual, moral e espiritual, que devem ser eliminados para se seguir em frente rumo à paz, à concórdia e à fraternidade universal, em que todos somos irmãos e filhos do mesmo Pai.
Segundo a Doutrina Espírita, o processo de evolução intelectual, moral e espiritual do ser humano, em pluralidade de existências, auxilia a eliminar vários sentimentos inferiores adquiridos em vida passadas, inclusive os preconceitos de toda a ordem. Entretanto, cada um de nós se encontra em um determinado estágio evolutivo.
Isso porque o processo evolutivo de educação e renovação do Espírito é longo, em que uma existência é insuficiente para se eliminar todos os preconceitos acumulados, mesmo porque “Deus criou todos os Espíritos simples e ignorantes, isto é, sem saber” (Resposta à questão 115, em “O Livro dos Espíritos).
Convém destacar que os preconceitos são sentimentos inferiores próprios dos Espíritos imperfeitos, que necessitam evoluir, como evidencia “O Livro dos Espíritos”, na questão 101, sobre essa categoria: “Restritos conhecimentos têm das coisas do mundo espírita e o pouco que sabem se confunde com as ideias e preconceitos da vida corporal. Acerca dessas coisas, não nos podem dar senão noções falsas e incompletas (…).”
Na questão 930, Kardec comenta sobre a evolução do ser humano: “Quando praticar a lei de Deus, terá uma ordem social fundada na justiça e na solidariedade e ele próprio também será melhor.”
Assim, as reencarnações, em pluralidade de existências, auxiliam o Espírito imortal a eliminar os preconceitos adquiridos em sua jornada evolutiva, desde a sua criação simples e ignorante, passando pelas necessárias provas e expiações que geram sofrimentos e dor, como formas de aprendizado, educação e renovação rumo à perfeição relativa à Humanidade, tendo o Mestre Jesus como modelo e guia para as nossas vidas.
Todo o reino dividido contra si mesmo é devastado (Mateus, 12: 22-26)
“Trouxeram-lhe, então, um endemoninhado cego e mudo; e, de tal modo o curou, que o cego e mudo falava e via. E toda a multidão se admirava e dizia: não é este o Filho de Davi? Mas os fariseus, ouvindo isto, diziam: este não expulsa os demônios senão por Belzebu, príncipe dos demônios. Jesus, porém, conhecendo os seus pensamentos, disse-lhes: todo o reino dividido contra si mesmo é devastado; e toda a cidade, ou casa, dividida contra si mesma não subsistirá. E, se Satanás expulsa a Satanás, está dividido contra si mesmo; como subsistirá, pois, o seu reino?” (Mateus, 12: 22-26).
Essa passagem evangélica está no contexto em que os religiosos judeus acusavam Jesus de curar e expulsar maus Espíritos por influência do demônio.
A resposta do Cristo foi: “Todo o reino dividido contra si mesmo é devastado; e toda a cidade, ou casa, dividida contra si mesma não subsistirá. E, se Satanás expulsa a Satanás, está dividido contra si mesmo; como subsistirá, pois, o seu reino?”
Da resposta do Mestre Jesus aos fariseus, podemos extrair algumas reflexões:
Como poderá haver união de ações edificantes para o bem se o nosso movente for de divisão ou separação, seja em qualquer nível da sociedade, no lar ou nas práticas religiosas?
Como alguém que pratica o bem e a caridade poderá estar sendo influenciado por maus Espíritos ou “demônios”? Qual é a lógica nisso?
Se o mal procura destruir o próprio mal, como poderá o mal subsistir e construir o seu reino?
Quanto aos aspectos religiosos, a cegueira dogmática, o fanatismo, o egoísmo de seita, o espírito de orgulho, a intolerância, a fé inoperante, a pretensão de reter a posse da verdade absoluta, a ambição de poder, o desvio doutrinário, o mercantilismo religioso, dentre outros tantos sentimentos inferiores, tornam-se fontes e instrumentos de divisão, desavenças, devastação e destruição.
Ao longo da história, muitos que praticavam o bem e a caridade foram injustamente hostilizados, intitulados de bruxos e martirizados por serem identificados como pessoas influenciadas pelo demônio.
A esse respeito, fez-me lembrar da Parábola do cego que guia outro cego: “E dizia-lhes uma parábola: Pode porventura o cego guiar o cego? Não cairão ambos na cova?” (Lucas, 6: 39). “Então, acercando-se dele os seus discípulos, disseram-lhe: Sabes que os fariseus, ouvindo essas palavras, se escandalizaram? Ele, porém, respondendo, disse: Toda a planta, que meu Pai celestial não plantou, será arrancada. Deixai-os; são cegos condutores de cegos. Ora, se um cego guiar outro cego, ambos cairão na cova”. (Mateus, 15: 12-14)
Nessa Parábola, os fariseus, em suas hipocrisias, valorizavam mais as práticas exteriores do que realmente seguir os preceitos das leis de Deus, e tinham a pretensão de ser os mais esclarecidos da sua nação. As práticas do bem e da caridade sucumbiam para o formalismo religioso. A maioria dos fariseus e escribas estava cega e surda espiritualmente.
O próprio Espiritismo também sofreu a acusação de ser obra do demônio, tanto que Allan Kardec, em “A Gênese”, Capítulo XV, “Os milagres do Evangelho”, registra:
“Os fariseus acusavam a Jesus de expulsar os demônios pela influência dos demônios. Segundo eles, o bem que Jesus fazia era obra de Satanás, sem refletirem que, se Satanás expulsasse a si mesmo, praticaria uma insensatez. É de notar-se que os fariseus daquele tempo já pretendessem que toda faculdade transcendente e, por esse motivo, reputada sobrenatural, era obra do demônio, visto que, na opinião deles, era do demônio que Jesus recebia o poder de que dispunha. É esse mais um ponto de semelhança daquela com a época atual e tal doutrina é ainda a que a Igreja procura fazer que prevaleça hoje, contra as manifestações espíritas” 188. (…)
“188 Nota de Allan Kardec: Nem todos os teólogos adotam opiniões tão absolutas sobre a doutrina demoníaca. Aqui está uma e o valor o clero não pode contestar, emitida por um eclesiástico, monsenhor Freyssinous, bispo de Hermópolis, na seguinte passagem das suas Conferências sobre a religião, volume II, p. 341 (Paris, 1825):
‘Se Jesus operasse seus milagres pelo poder do demônio, este teria trabalhado pela destruição do seu império e, portanto, empregado contra si próprio o seu poder. Certamente, um demônio que procurasse destruir o reinado do vício para implantar o da virtude seria um demônio muito singular. Eis por que Jesus, para repelir a absurda acusação dos judeus, lhes dizia: Se opero prodígios em nome do demônio, o demônio está dividido consigo mesmo, trabalhando, conseguintemente, para a sua própria destruição’. Esta resposta não admite réplica.
É justamente o argumento que os espíritas opõem aos que atribuem ao demônio os bons conselhos que os Espíritos lhes dão. O demônio agiria então como um ladrão profissional que restituísse tudo o que houvesse roubado e exortasse os outros ladrões a se tornarem pessoas honestas”.
Em um mundo regenerado, a integração religiosa será um grande desafio, mas, cedo ou tarde, ela deverá ocorrer pela força das coisas e pela necessidade de se estreitar os laços de fraternidade entre as nações.
As pessoas se manterão unidas pela crença em princípios espirituais universais e por um laço de fraternidade. Compreenderão que somente o progresso moral pode assegurar aos homens a felicidade na Terra, refreando as paixões más.
Nesse sentido, o Espírito Emmanuel, em “Unificação”, na psicografia de Francisco Cândido Xavier, orienta: “Lembremo-nos de que a vitória do Evangelho, ainda não alcançada, começou com a congregação de doze aprendizes, humildes e sinceros, em torno de um Mestre sábio, paciente, generoso e justo, e continuemos, cada qual de nós, no posto de trabalho que nos compete, atentos às determinações divinas, da execução do próprio dever” (Reformador, out. 1977, p. 301).
Para nós cristãos, não podemos esquecer as palavras do Mestre Jesus: “Eu sou o bom Pastor, e conheço as minhas ovelhas, e das minhas sou conhecido. Assim como o Pai me conhece a mim, também eu conheço o Pai e dou a minha vida pelas ovelhas. Ainda tenho outras ovelhas que não são deste aprisco; também me convém agregar estas, e elas ouvirão a minha voz, e haverá um rebanho e um Pastor”. (João, 10: 14-16)
Nessa passagem, Jesus retrata a diversidade religiosa de sua época, cuja maioria acreditava em vários deuses. Mesmo entre os judeus, existiam divisões quanto à revelação de Moisés. Apesar da evolução ocorrida, hoje, a situação não é muito diferente, cujos antagonismos religiosos alimentam adeptos na posse exclusiva da verdade eterna.
O Cristo, como o bom Pastor, conhece as suas ovelhas e elas o conhecem, porquanto os adeptos do Cristianismo procuram seguir as suas orientações. Contudo, a mensagem cristã não é crença universal. Daí Jesus anunciar a conveniência de agregar ao seu aprisco outras ovelhas, as que ainda não aceitam ou desconhecem a sua mensagem de amor.
A profecia “haverá um rebanho e um Pastor” indica o surgimento de uma geração nova, solidária e fraterna, que caminhará unida em busca da felicidade espiritual. Representa a idade de maturidade espiritual da Humanidade. A nova geração marchará para a realização de todas as ideias humanitárias compatíveis com o grau de adiantamento a que houver chegado.
Trata-se de uma profecia que será cumprida, possivelmente, durante o período de regeneração, quando a Humanidade estará mais unida por ideias comuns, sobretudo no campo da fé. Estenderemos as mãos uns aos outros, quando todos os homens estiverem convencidos de que Deus é o mesmo para todos, que somos filhos do mesmo Pai e que esse Deus, soberanamente justo e bom, nada de injusto pode querer.
Assim, não devemos dar guarida a manifestações que dividem, diminuem ou subtraem, mas sim aquelas que somem, multipliquem e unem para o caminho da verdade e da vida, em direção ao Pai, tendo Jesus como modelo e guia, pois ninguém chega a Deus senão por Ele.
O Centurião de Cafarnaum (Mateus, 8: 5-13)
“Tendo Jesus entrado em Cafarnaum, chegou-se a ele um centurião e rogou-lhe: Senhor, o meu criado jaz em casa paralítico, padecendo horrivelmente. Disse-lhe: eu irei curá-lo. Mas o centurião respondeu: Senhor, eu não sou digno de que entres em minha casa; mas dize somente uma palavra e o meu criado há de sarar. Porque também eu sou homem sujeito à autoridade e tenho soldados às minhas ordens, e digo a um: vai ali, e ele vai; a outro: vem cá, e ele vem; e ao meu servo: faze isto, e ele o faz. Jesus ouvindo isto admirou-se e disse aos que o acompanhavam: Em verdade vos afirmo que nem mesmo em Israel encontrei tamanha fé. E digo-vos que muitos virão do Oriente e do Ocidente, e hão de sentar-se com Abraão, Isaac e Jacó no Reino dos Céus; mas os filhos deste reino serão lançados nas trevas exteriores; ali haverá choro e ranger de dentes. Então disse Jesus ao centurião: Vai-te, e como creste, assim te seja feito. E naquela mesma hora sarou o criado”. (Mateus, 8: 5-13)
“E o servo de um certo centurião, a quem muito estimava, estava doente, e moribundo. E, quando ouviu falar de Jesus, enviou-lhe uns anciãos dos judeus, rogando-lhe que viesse curar o seu servo. E, chegando eles junto de Jesus, rogaram-lhe muito, dizendo: É digno de que lhe concedas isto, Porque ama a nossa nação, e ele mesmo nos edificou a sinagoga. E foi Jesus com eles; mas, quando já estava perto da casa, enviou-lhe o centurião uns amigos, dizendo-lhe: Senhor, não te incomodes, porque não sou digno de que entres debaixo do meu telhado. E por isso nem ainda me julguei digno de ir ter contigo; dize, porém, uma palavra, e o meu criado sarará. Porque também eu sou homem sujeito à autoridade, e tenho soldados sob o meu poder, e digo a este: Vai, e ele vai; e a outro: Vem, e ele vem; e ao meu servo: Faze isto, e ele o faz. E, ouvindo isto Jesus, maravilhou-se dele, e voltando-se, disse à multidão que o seguia: Digo-vos que nem ainda em Israel tenho achado tanta fé. E, voltando para casa os que foram enviados, acharam são o servo enfermo”. (Lucas 7: 2-10)
Esta passagem evangélica trata da importância da prática do bem, da solidariedade, da intercessão, da gratidão e da fé, independentemente da sua crença, cujas ideias principais são as seguintes:
- “o centurião representa o exemplo de homem de bem que, por força das qualidades morais e da fé que possuía, conseguiu transformar adversários em amigos, os quais se solidarizaram com ele num momento em que buscou auxílio de Jesus em benefício de um servo doente”;
- o pedido de auxílio a Jesus veio de um Centurião, indivíduo pertencente ao quadro do exército invasor;
- o beneficiado não era alguém social ou politicamente importante, mas um escravo;
- o endosso concedido pelos anciãos, ao pedido do romano, destaca as qualidades morais do Centurião;
- evidencia a surpreendente fé do romano, destacada por Jesus. Foi pela fé purificada e pela humildade do Centurião, que o Mestre justificou, dizendo: “em verdade vos afirmo que nem mesmo em Israel achei tamanha fé”. Essa afirmação do Mestre serviu, também, de incentivo àqueles que o ouviam, para que fizessem também crescer a fé que possuíam;
- a principal mensagem da passagem é mostrar a força do bem que marca as ações de todos os personagens envolvidos nessa história;
- os representantes dos judeus revelaram possuir o nobre sentimento da gratidão;
- além da força do bem, a importância da intercessão em benefício de alguém. Foi pela intercessão do Centurião, que Jesus realiza a cura a distância;
- a maravilhosa frase: “Senhor, não é preciso que te incomodes tanto. Nem eu mesmo sou digno de te receber em minha casa. Dize somente uma palavra, e meu servo se curará”, demonstra humildade e revela a beleza da alma daquele centurião.
Em “O Livro dos Espíritos”, de Allan Kardec, temos:
“918. Por que indícios se pode reconhecer em um homem o progresso real que lhe elevará o Espírito na hierarquia espírita?
‘O Espírito prova a sua elevação, quando todos os atos de sua vida corporal representam a prática da lei de Deus e quando antecipadamente compreende a vida espiritual.”
Em seguida, Kardec cometa:
“Verdadeiramente, homem de bem é o que pratica a lei de justiça, amor e caridade, na sua maior pureza. Se interrogar a própria consciência sobre os atos que praticou, perguntará se não transgrediu essa lei, se não fez o mal, se fez todo bem que podia, se ninguém tem motivos para dele se queixar, enfim se fez aos outros o que desejara que lhe fizessem.
Possuído do sentimento de caridade e de amor ao próximo, faz o bem pelo bem, sem contar com qualquer retribuição, e sacrifica seus interesses à justiça.
É bondoso, humanitário e benevolente para com todos, porque vê irmãos em todos os homens, sem distinção de raças, nem de crenças.
Se Deus lhe outorgou o poder e a riqueza, considera essas coisas como um depósito, de que lhe cumpre usar para o bem. Delas não se envaidece, por saber que Deus, que as deu, também as pode retirar.
Se sob a sua dependência a ordem social colocou outros homens, trata-os com bondade e complacência, porque são seus iguais perante Deus. Usa da sua autoridade para lhes levantar o moral e não para os esmagar com o seu orgulho”.
Os atributos comentados por Kardec podem ser reconhecidos no Centurião de Cafarnaum, porquanto “para fazer-se o bem, é preciso sempre a ação da vontade” (Allan Kardec, O Evangelho Segundo o Espiritismo. Cap. XV, item 10)
O Romano, nessa passagem, destaca-se pela ação benevolente, pela caridade e pelo amor ao próximo, como podemos extrair da mensagem do Espírito Emmanuel, na psicografia de Francisco Cândido Xavier:
“Árvore alguma será conhecida ou amada pelas aparências exteriores, mas sim pelos frutos, pela utilidade, pela produção. Assim também nosso espírito em plena jornada… Ninguém que se consagre realmente à verdade dará testemunho de nós pelo que parecemos, pela superficialidade de nossa vida, pela epiderme de nossas atitudes ou expressões individuais percebidas ou apreciadas de passagem, mas sim pela substância de nossa colaboração no progresso comum, pela importância de nosso concurso no bem geral.
– ‘Pelos frutos os conhecereis’ – disse o Mestre.
– ‘Pelas nossas ações seremos conhecidos’ – repetiremos nós”. (Emmanuel. Fonte Viva)
Com os esclarecimentos expostos e a título de conclusão, citaremos “O homem de bem”, de “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, de Allan Kardec, que sintetiza os seus atributos:
“O verdadeiro homem de bem é aquele que pratica a lei de justiça, de amor e caridade, na sua maior pureza. Se interroga a sua consciência sobre os próprios atos, pergunta se não violou essa lei, se não cometeu o mal, se fez todo o bem que podia, se não deixou escapar voluntariamente uma ocasião de ser útil, se ninguém tem do que se queixar dele, enfim, se fez aos outros aquilo que queria que os outros fizessem por ele.
Tem fé em Deus, na sua bondade, na sua justiça e na sua sabedoria; sabe que nada acontece sem a sua permissão, e submete-se em todas as coisas à sua vontade.
Tem fé no futuro, e por isso coloca os bens espirituais acima dos bens temporais.
Sabe que todas as vicissitudes da vida, todas as dores, todas as decepções, são provas ou expiações, e as aceita sem murmurar.
O homem possuído pelo sentimento de caridade e de amor ao próximo faz o bem pelo bem, sem esperar recompensa, paga o mal com o bem, toma a defesa do fraco contra o forte e sacrifica sempre o seu interesse à justiça.
Encontra usa satisfação nos benefícios que distribui, nos serviços que presta, nas venturas que promove, nas lágrimas que faz secar, nas consolações que leva aos aflitos. Seu primeiro impulso é o de pensar nos outros., antes que em si mesmo, de tratar dos interesses dos outros, antes que dos seus. O egoísta, ao contrário, calcula os proveitos e as perdas de cada ação generosa.
É bom, humano e benevolente para com todos, sem distinção de raças nem de crenças, porque vê todos os homens como irmãos.
Respeita nos outros todas as convicções sinceras, e não lança o anátema aos que não pensam como ele.
Em todas as circunstâncias, a caridade é o seu guia. Considera que aquele que prejudica os outros com palavras maldosas, que fere a suscetibilidade alheia com o seu orgulho e o seu desdém, que não recua à ideia de causar um sofrimento, uma contrariedade, ainda que ligeira, quando a pode evitar, falta ao dever do amor ao próximo e não merece a clemência do Senhor.
Não tem ódio nem rancor, nem desejos de vingança. A exemplo de Jesus, perdoa e esquece as ofensas, e não se lembra senão dos benefícios. Porque sabe que será perdoado, conforme houver perdoado.
É indulgente para as fraquezas alheias, porque sabe que ele mesmo tem necessidade de indulgência, e se lembra destas palavras do Cristo: “Aquele que está sem pecado atire a primeira pedra”.
Não se compraz em procurar os defeitos dos outros, nem a pô-los em evidência. Se a necessidade o obriga a isso, procura sempre o bem que pode atenuar o mal.
Estuda as suas próprias imperfeições, e trabalha sem cessar em combatê-las. Todos os seus esforços tendem a permitir-lhe dizer, amanhã, que traz em si alguma coisa melhor do que na véspera.
Não tenta fazer valer o seu espírito, nem os seus talentos, às expensas dos outros. Pelo contrário, aproveita todas as ocasiões para fazer ressaltar a vantagens dos outros.
Não se envaidece em nada com a sua sorte, nem com os seus predicados pessoais, porque sabe que tudo quanto lhe foi dado pode ser retirado.
Usa mas não abusa dos bens que lhe são concedidos, porque sabe tratar-se de um depósito, do qual deverá prestar contas, e que o emprego mais prejudicial para si mesmo, que poderá lhes dar, é pô-los ao serviço da satisfação de suas paixões.
Se nas relações sociais, alguns homens se encontram na sua dependência, trata-os com bondade e benevolência, porque são seus iguais perante Deus. Usa sua autoridade para erguer-lhes a moral, e não para os esmagar com o seu orgulho, e evita tudo quanto poderia tornar mais penosa a sua posição subalterna.
O subordinado, por sua vez, compreende os deveres da sua posição, e tem o escrúpulo de procurar cumpri-los conscientemente. (Ver Cap. XVII, nº 9)
O homem de bem, enfim, respeita nos seus semelhantes todos os direitos que lhes são assegurados pelas leis da natureza, como desejaria que os seus fossem respeitados.
Esta não é a relação completa das qualidades que distinguem o homem de bem, mas quem quer que se esforce para possuí-las, estará no caminho que conduz às demais”. (Kardec, O Evangelho Segundo o Espiritismo, Cap. XVII, item 3)
Assim, quem faz o bem edificante com caridade e fraternidade universal, independentemente de qual seja a sua crença, não pode ser do mal.
Bibliografia:
BÍBLIA SAGRADA.
KARDEC, Allan; tradução de Evandro Noleto Bezerra. A Gênese. 2ª Edição. Brasília/DF: Federação Espírita Brasileira, 2013.
KARDEC, Allan; tradução de Guillon Ribeiro. O Evangelho Segundo o Espiritismo. 1ª Edição. Brasília/DF: Federação Espírita Brasileira, 2019.
KARDEC, Allan; tradução de Guillon Ribeiro. O livro dos espíritos. 1ª Edição. Brasília/DF: Federação Espírita Brasileira, 2019.
MOURA, Marta Antunes de Oliveira. Estudo aprofundado da doutrina espírita: Ensinos e parábolas de Jesus – Parte I. Orientações espíritas e sugestões didático-pedagógicas direcionadas ao estudo do aspecto religioso do Espiritismo. 1ª Edição. Brasília/DF: Federação Espírita Brasileira, 2015.
MOURA, Marta Antunes de Oliveira de (Organizadora). Estudo aprofundado da doutrina espírita: Ensinos e parábolas de Jesus – Parte II: orientações espíritas e sugestões didático-pedagógicas direcionadas ao estudo do aspecto religioso do Espiritismo. 1ª Edição. 1ª Edição. Brasília/DF: Federação Espírita Brasileira, 2016.
SCHUTEL, Cairbar. Parábolas e Ensino de Jesus. 28ª Edição. Matão/SP: Casa Editora O Clarim, 2016.