Essa reflexão tem como propósito o entendimento de alguns passos necessários para impulsionar uma reforma íntima, os quais podem ser resumidos em: autodescobrimento, autoconhecimento e consciência de si mesmo, para a identificação e o reconhecimento do que se precisar melhorar para evoluir moral e espiritualmente.
Isso porque a conscientização de si mesmo, por meio do autodescobrimento e do autoconhecimento, permite ao ser humano vivenciar, experimentar e compreender aspectos do seu mundo interior e a percepção do mundo em que vive, dentro de uma relação do “eu” com o ambiente em sociedade, para realizar uma avaliação crítica do que é moralmente certo ou errado em atos e motivos individuais.
A reflexão e a introspecção conduzem para identificar as próprias imperfeições e reconhecer o que é preciso melhorar para seguir o caminho da renovação decorrente das transformações vivenciadas pelo Espírito. E ainda auxiliam a identificar e reconhecer as possibilidades, os recursos latentes e os meios que poderão ser utilizados nessa empreitada renovadora.
Afinal das contas, quem vai julgar pelo que fizemos ou deixamos de fazer é a própria consciência, porquanto a consciência é essência da personalidade, pois somos responsáveis pelos nossos atos ou omissões. Perante as leis divinas, seremos julgados e condenados pela própria consciência.
É a própria consciência também que vai atrair as oportunidades de reajustes, reabilitação e regeneração da alma.
A consciência de si mesmo e a percepção das coisas exteriores relacionam-se com a inteligência, a vontade, a liberdade e a responsabilidade.
Nesse aspecto, a Doutrina Espírita esclarece que, na infância espiritual, o Espírito é movido pelo instinto de sobrevivência, não tendo consciência de si e pouca é a sua liberdade de escolha. O livre-arbítrio e a liberdade de escolha, entre o bem e o mal, desenvolvem-se à medida que o Espírito adquire inteligência e consciência de si mesmo.
Allan Kardec, em “O Livro dos Espíritos”, “Inteligência e instinto”, na questão 71, esclarece: “A inteligência é uma faculdade especial, peculiar a algumas classes de seres orgânicos e que lhes dá, com o pensamento, a vontade de atuar, a consciência de que existem e de que constituem uma individualidade cada um, assim como os meios de estabelecerem relações com o mundo exterior e de proverem às suas necessidades.”
Na questão 171, em “O Livro dos Espíritos”, Kardec comenta: “O homem, que tem consciência da sua inferioridade, haure consoladora esperança na doutrina da reencarnação.”
Autodescobrimento
O Espírito Joanna de Ângelis, no livro “Autodescobrimento: uma busca interior”, na psicografia de Divaldo Pereira Franco, ensina:
“A necessidade (…) do autodescobrimento, em uma panorâmica racional, torna-se inadiável, a fim de favorecer a recuperação, quando em estado de desarmonia, ou o crescimento, se portador de valores intrínsecos latentes. Enquanto não se conscientize das próprias possibilidades, o indivíduo aturde-se em conflitos de natureza destrutiva, ou foge espetacularmente para estados depressivos, mergulhando em psicoses de vária ordem, que o dominam e inviabilizam a sua evolução, pelo menos momentaneamente.
A experiência do autodescobrimento faculta-lhe identificar os limites e as dependências, as aspirações verdadeiras e as falsas, os embustes do ego e as imposturas da ilusão. (…)
Fazem-se imprescindíveis alguns requisitos para que seja logrado o autodescobrimento com a finalidade de bem-estar e de logros plenos, a saber: insatisfação pelo que se é, ou se possui, ou como se encontra; desejo sincero de mudança; persistência no tentame; disposição para aceitar-se e vencer-se; capacidade para crescer emocionalmente. (…)
É imprescindível um constante renascer do indivíduo, pelo renovar da sua consciência, aprofundando-se no autodescobrimento, a fim de mais seguramente identificar-se com a realidade e absorvê-la. Esse autodescobrimento faculta uma tranquila avaliação do que ele é, e de como está, oferecendo os meios para torná-lo melhor, alcançando assim o destino que o aguarda. (…)
Tudo começa na mente e aí estão as matrizes das próximas ações. O exercício do bem-pensar, eliminando as ideias perniciosas a que se está viciado, constitui passo decisivo para o autodescobrimento. Cada vez interrogar-se mais a respeito de quem é, e quais as possibilidades de que se pode utilizar para o desenvolvimento íntimo, significa um meio adequado para interpenetrar-se. Sistematicamente manter-se vigilante contra os hábitos prejudiciais da autocompaixão, da censura ao comportamento dos outros, da autopunição e autodesvalorização, da inveja e de outros componentes do grupo das paixões dissolventes e anestesiantes. Preencher os lugares que ficarão vagos com a eliminação desses sórdidos comparsas mentais, com a presença do altruísmo, da fraternidade, do autoamor. (…)
Aquele que se conhece, sabe de quais recursos se podem utilizar para o desempenho das tarefas e funções que lhe cumpre executar, aceitando-as como parte do processo existencial, no qual está inserido. Essa compreensão dá-lhe dignidade, enriquecendo-o de entusiasmo a cada conquista, como perspectiva da próxima vitória. (…)
O autodescobrimento enseja humildade perante a vida, sem postura humilhante, porque faculta a irradiação do amor desde o centro do Si, consciente da sua realidade e origem divina. (…)
Esse esforço bem direcionado, graças ao autodescobrimento, pode ser considerado um renascimento psicológico na vitoriosa reencarnação, cuja meta é desenvolver os valores ínsitos no Espírito e reparar as opções que geraram provas e expiações na passada experiência carnal.”
Autoconhecimento
No mesmo livro, Joanna de Ângelis esclarece:
“… o autoconhecimento desempenha relevante papel no adestramento do ser para a sua superação e perfeita sintonia com a paz.
Nesse desiderato, são investidos os mais expressivos recursos psicológicos e morais, de modo a serem alcançadas as metas que se sucedem, patamar a patamar, até alcançarem o nível de libertação interior. (…)
No inevitável processo de evolução do ser, o despertar da consciência abre-lhe as percepções para a realidade de si mesmo, e o consequente entendimento dos objetivos da existência corporal.
Imediatamente, a necessidade do autoconhecimento constitui-lhe um desafio que deve ser vencido a esforço tenaz, porquanto lhe propiciará a identificação dos recursos intelecto-morais disponíveis e dos prejuízos comportamentais que decorrem dos vícios e paixões primitivas, remanescentes dos níveis de sono e de indiferença ora ultrapassados.
Conhecidos os próprios limites íntimos e as ricas possibilidades diante de si, ampliam-se os horizontes do discernimento e as opções pela libertação dos atavismos perniciosos, ensejando-o avançar, mesmo sob a imposição de sacrifícios. (…)
Todo o curso da evolução (tomada de consciência) tem como estrutura o autoconhecimento – que proporciona o autoamor – passo decisivo para que essa força criadora desabroche com todas as potências que lhe são pertinentes.
Sob o seu pálio, o sofrimento se descaracteriza e perde o conteúdo atormentante que o assinala, passando a ser um élan de alegria e de felicidade.”
Reforma íntima
Assim, Deus nos chama à responsabilidade pelos atos praticados. Pela justiça divina, somos educados para melhorar e evoluir, pois a vida tem um sentido existencial. Tudo tem um motivo, um propósito, uma finalidade e uma vontade divina na construção do nosso destino e na cocriação de um mundo mais fraterno.
A Doutrina Espírita, com seus esclarecimentos, foca, principalmente, a pessoa e o seu interior para estimular a renovação e a regeneração.
Propõe a reforma íntima como a luta necessária contra as próprias imperfeições na busca da melhoria moral para seguir em frente no caminho do progresso moral e espiritual.
Tudo isso mediante esforço próprio e trabalho edificante pela prática do verdadeiro amor e da caridade que salva.
Porque somos um mundo interior, morada íntima e microcosmo individual ou universo a parte, local de transformação, renovação, fé, cura e de progresso espiritual na batalha íntima do bem contra o mal, com um ritmo evolutivo próprio condizente com o nosso grau de consciência e amor.
Muitos buscam a felicidade momentânea em lugares, bens materiais, poder ou pessoas. Projetam as causas das aflições e dos sofrimentos em algo, alguém ou ao acaso. Porém, esquecem que a construção da verdadeira felicidade começa na edificação do próprio ser. A transformação do ser humano é uma ação de dentro para fora, mediante processo contínuo de aprimoramento.
A Terra, mundo de provas e expiações, é escola abençoada e estágio necessário para essa evolução, e não uma prisão de penas eternas. A busca da felicidade é uma realidade a que todos estamos destinados pelo determinismo divino da reencarnação em pluralidade de existências na busca da perfeição.
Para alcançarem essa perfeição, têm que sofrer todas as vicissitudes da existência corporal. (Questão 132. O Livro dos Espíritos)
O Espírito imortal necessita adquirir todas as virtudes e aptidões pela prática do bem, do amor e da caridade, concorrendo para a execução dos propósitos divinos, no limite do desenvolvimento de suas forças físicas e intelectuais, em que cada um tem seu papel a desempenhar, sendo solidário coletivamente para o progresso geral.
Muitos dos males que vivemos são frutos do nosso caráter, da maneira de proceder, da imprevidência, do egoísmo, do orgulho, da ambição, da falta de perseverança para resistir às tentações, das paixões descontroladas, dos desejos insaciáveis, da excessiva vaidade, da ausência de moderação, da raiva dominante, do ódio doentio, das más tendências, da fraqueza moral, da indiferença para com o próximo, da ingratidão, da cegueira para as coisas de Deus.
Para garantir a libertação da alma, o Espírito tem de renunciar às suas imperfeições, fazendo despertar o arrependimento das faltas cometidas, mediante o desejo de se depurar e reparar o mal causado.
Toda falta cometida é dívida contraída que deverá ser paga. Se não for em uma existência, será na seguinte ou seguintes, porque todas as existências são solidárias entre si. Os males são causados por nós mesmos, nesta vida ou em existências passadas, porquanto não há efeito sem causa.
Pela Lei de Causa e Efeito, tudo o que plantamos no passado colhemos agora. As nossas escolhas de agora determinarão o que vamos colher no futuro.
Pelo véu do esquecimento, não temos lembrança da vida passada durante a vida corpórea, o que permite a regeneração do Espírito.
Em cada estágio da prática do amor divino, purificamos o coração das nossas próprias imperfeições mediante as lutas renovadoras. A cada experiência amorosa, sobe-se um degrau evolutivo. O amor tudo modifica, transforma, cura e regenera.
À medida que o ser humano avança na vida espiritual, a alma que enveredou pelo mau caminho se esclarece e despoja, pouco a pouco, de suas imperfeições, conforme a maior ou menor boa vontade que demonstre, em virtude do seu livre-arbítrio.
O esforço de purificação é objetivo essencial daqueles que se encontram conscientes da necessidade de aperfeiçoamento moral e espiritual, tornando-os pessoas melhores pela assepsia de pensamentos e seleção de atitudes perante a si mesmo e com o seu próximo.
Devemos ir ao encontro de Jesus, buscar sua fonte amorosa e energia fluídica irradiante pelos canais condutores da fé.
Diante das aflições, precisamos ter a paz do Cristo e bom ânimo para enfrentar as provações e expiações, afastando a angústia, a ansiedade, o medo, o desânimo, a depressão e os maus pensamentos.
Cristo espera que adotemos uma postura de levantar-se e seguir em frente. Reparando o tempo perdido, façamos brilhar a nossa luz para a vida, aproveitando a experiência do passado para construir um novo futuro.
É indispensável a luta do bem contra o mal dentro do próprio íntimo para se tornar possível o triunfo futuro. Quanto mais a alma se eleva, cresce, se faz bela, tanto mais a dor se espiritualiza e torna sutil.
A evolução moral e espiritual será mediante a depuração das nossas imperfeições no caminho da verdade e da vida a caminho do Pai em pluralidade de existências.
Bibliografia
ÂNGELIS, Joanna (Espírito); na psicografia de Divaldo Pereira Franco. Autodescobrimento: uma busca interior. 1ª Edição. Salvador/BA: Editora Leal, 2002.
BÍBLIA SAGRADA.
DENIS, León. O problema do ser, do destino e da dor. 32ª Edição. Brasília/DF: Federação Espírita Brasileira, 2017.
KARDEC, Allan; tradução de Evandro Noleto Bezerra. A Gênese. 2ª Edição. Brasília/DF: Federação Espírita Brasileira, 2013.
KARDEC, Allan; tradução de Guillon Ribeiro. O Evangelho Segundo o Espiritismo. 1ª Edição. Brasília/DF: Federação Espírita Brasileira, 2019.
KARDEC, Allan; tradução de Guillon Ribeiro. O Livro dos Espíritos. 1ª Edição. Brasília/DF: Federação Espírita Brasileira, 2019.
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